Realidade Inventada (ou a_corda)
Durante um tempo, escrevi um diário inventado. Era um daqueles cadernos infantis, com páginas coloridas (um punhado de folhas azuis, depois verdes e, por fim, cor-de-rosa) e exalava um enjoativo cheiro doce. Não o escolhera a dedo, apenas o encontrei jogado e o adotei. Como não queria transformá-lo em mais um caderno cheio de confissões e anotações tediosas sobre meu cotidiano, achei que seria interessante inventar um pouco a minha própria realidade.
No começo eram fatos reais, com apenas um ou outro detalhe alterado, só para me divertir. Logo se tornou uma confissão sincera de sentimentos que nunca tive.
Enquanto vivia um romance morno, escrevia uma vida tórrida de amores diversos sem fim nem começo, apenas meio. Não era, de forma alguma, um diário de frustrações pessoais ou de uma vida que não levava por falta de coragem, mas de vontade.
Queria sentir a vida de outros e vivê-la pela minha imaginação, já que pela realidade não seria tão verdadeiro. Talvez seja culpa da minha mente feminina que consegue conciliar ideias antagônicas sem cair em contradição, como a lua que não deixa de ser o mesmo satélite até em fases opostas – cheia ou nova, crescente ou minguante.
Meus suspiros e anseios eram sempre mais verdadeiros quando inventados. A vida real, por outro lado, era uma existência aconchegante, sem as incertezas e ímpetos que dominavam a minha imaginação e a tingiam com um colorido impossível, que faziam arder os olhos. Dois lados igualmente atrativos e que me encantavam com a mesma intensidade.
O desfecho ocorreu quando tentei unir os dois extremos, que naquele momento já eram tão distantes e distintos que nem pareciam partir da mesma pessoa. De fato, cada mundo – o real e o inventado – era igualmente forte e se esticavam em sentidos opostos. Eu era a corda num jogo de cabo de guerra e nenhum dos lados queria ceder (e eu não sabia para qual lado torcer). Sentia que um dia seria partida ao meio e destruída em prol de um jogo que se estendera por quase dois anos.
Foi então que tive a ideia de reforçar a corda, trazendo outro para o meu mundo bipolar e ajudar a segurar as pontas. O escolhido era alguém com quem eu dividia tudo, meus sonhos e meus pesadelos, minha mente e meu corpo. Tinha certeza de que ele me entenderia, visto que também possuía uma imaginação livre e se perdia em devaneios.
Mas toda a certeza escoou à medida que ele lia aquele diário com aroma enjoativo, e notei seu olhar de asco logo nas primeiras páginas. Fiz-lhe o favor de tirar-lhe das mãos o meu diário e nada mais falamos até o final do dia. Um mês depois, já não éramos mais um “nós”, apenas “ela” e “ele”.
Já não sentia mais a mesma naturalidade em inventar minha realidade e o diário parou por ali, com metade das folhas cor-de-rosa em branco. O fogo apagou qualquer evidência daqueles momentos pelos quais jamais passei, mas que vivi intensamente. A corda havia se rompido e até hoje não sei para que lado o meu corpo foi.
No começo eram fatos reais, com apenas um ou outro detalhe alterado, só para me divertir. Logo se tornou uma confissão sincera de sentimentos que nunca tive.
Enquanto vivia um romance morno, escrevia uma vida tórrida de amores diversos sem fim nem começo, apenas meio. Não era, de forma alguma, um diário de frustrações pessoais ou de uma vida que não levava por falta de coragem, mas de vontade.
Queria sentir a vida de outros e vivê-la pela minha imaginação, já que pela realidade não seria tão verdadeiro. Talvez seja culpa da minha mente feminina que consegue conciliar ideias antagônicas sem cair em contradição, como a lua que não deixa de ser o mesmo satélite até em fases opostas – cheia ou nova, crescente ou minguante.
Meus suspiros e anseios eram sempre mais verdadeiros quando inventados. A vida real, por outro lado, era uma existência aconchegante, sem as incertezas e ímpetos que dominavam a minha imaginação e a tingiam com um colorido impossível, que faziam arder os olhos. Dois lados igualmente atrativos e que me encantavam com a mesma intensidade.
O desfecho ocorreu quando tentei unir os dois extremos, que naquele momento já eram tão distantes e distintos que nem pareciam partir da mesma pessoa. De fato, cada mundo – o real e o inventado – era igualmente forte e se esticavam em sentidos opostos. Eu era a corda num jogo de cabo de guerra e nenhum dos lados queria ceder (e eu não sabia para qual lado torcer). Sentia que um dia seria partida ao meio e destruída em prol de um jogo que se estendera por quase dois anos.
Foi então que tive a ideia de reforçar a corda, trazendo outro para o meu mundo bipolar e ajudar a segurar as pontas. O escolhido era alguém com quem eu dividia tudo, meus sonhos e meus pesadelos, minha mente e meu corpo. Tinha certeza de que ele me entenderia, visto que também possuía uma imaginação livre e se perdia em devaneios.
Mas toda a certeza escoou à medida que ele lia aquele diário com aroma enjoativo, e notei seu olhar de asco logo nas primeiras páginas. Fiz-lhe o favor de tirar-lhe das mãos o meu diário e nada mais falamos até o final do dia. Um mês depois, já não éramos mais um “nós”, apenas “ela” e “ele”.
Já não sentia mais a mesma naturalidade em inventar minha realidade e o diário parou por ali, com metade das folhas cor-de-rosa em branco. O fogo apagou qualquer evidência daqueles momentos pelos quais jamais passei, mas que vivi intensamente. A corda havia se rompido e até hoje não sei para que lado o meu corpo foi.
No nosso mundo às vezes só cabe um rei.
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