Fotografias modernas (ou abecedário de histórias que ouvi bebendo sozinho na Praça da Bicota)

André queria se matar. Subiu até o último andar de seu prédio, olhou para baixo e desistiu: tinha medo de altura

Bianca odiava o trânsito, seu trabalho, sua cidade e até mesmo seu país, mas sentia-se a pessoa mais feliz do mundo quando a cachorra lambia seu rosto todo dia de manhã

Carlos ficou muito triste quando percebeu que faltava naturalidade nas pessoas. Teve esse insight no terceiro ano vivendo numa comunidade naturalista

Daniela queria um amor; e recusou todos os amores que apareceram porque não era aquele que queria

Elías julgava-se o mais tolo dos tolos; por isso, decidiu virar poeta

Farías descobriu qual era a maior hipocrisia do mundo quando levantou o dedo para chamar seu irmão de hipócrita.

Gustavo estava deprimido porque não tinha o que fazer. Escreveu, terminou e viu que nada adiantou: concluiu sua tarefa e veio novamente a melancolia.

Hiago achava as noites de São Paulo muito tristes. Numa delas, conheceu Iara e tornou-se o mais feliz dos homens.

Jorge sonhava em ser piloto de avião, porém virou lojista. Viajava para países distantes nas férias só para ficar horas e horas no ar.

Lorraine abraçou seu pai e chorou: fazia tempo que não se via nos braços de um homem.

Márcio, também conhecido como Nóinha, era o traficante mais malvado da quebrada. Comia todas, bebia, cheirava e matava sem dó. Virou crente e teve todos os seus pecados perdoados.

Otávio morria de rir quando deitava no colo de sua mãe e ouvia os barulhinhos da barriga dela

Penélope olhou para um letreiro e disse a ela mesma: C+O, co; C+A, ca; C+O, co; L+A, la: Coca-cola! Desde aquele dia em que foi alfabetizada, sua paixão era desvendar as palavras do mundo

Quagliarella sentia-se o maior homem vivente. A culpa não era toda dele: ultra-premiado, o chamavam de gênio porque roubava as histórias dos outros e contava para todo o mundo. Quagliarella era jornalista

Roberval estava triste. Foi ao médico e este lhe receitou um remédio para a felicidade.

Silvana não conseguia dormir. Foi ao médico e este lhe receitou um remédio para o sono

Talita não emagrecia de jeito nenhum. Foi ao médico e este lhe receitou um remédio para perder peso

Ulisses estava cansado de sempre broxar. Foi ao médico e este lhe receitou um remédio para o pau subir

Victor percebeu o quanto estava irritado quando quase bateu em sua esposa. Foi ao médico e este lhe receitou um remédio para se acalmar

Xavier, cheio dos problemas internos, concluiu que não sabia viver. Não havia remédios para seu problema.

Zelia abriu a porta do apartamento e deu graças a Deus por seu filho André ter voltado com segurança do trabalho e ser um rapaz bonito e saudável.

Comentários

  1. "Xavier, cheio dos problemas internos, concluiu que não sabia viver. Não havia remédios para seu problema." às vezes a vida resolve ser assim.

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  2. Adorei sua criatividade.
    Comecei a ler e quando me dei conta você seguia uma ordem. Parabéns!

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  3. wilson lê os contos de seu primo e sorri. gosta da simplicidade de suas palavras. inspirado, percebe, então, que deve fazer o mesmo.

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  4. Breno vai ao doutor da cabeça por queixar-se de tristeza, este lhe recomenda ir ao circo, pois o Grande Palhaço Auguste está na cidade. "Mas, doutor, eu sou o Grande Palhaço Auguste.".

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  5. ana lê o conto, fica encantada, feliz e resolve escrever. não dá certo, as coisas são assim mesmo, e então vai comer um bolinho.

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  6. Estou gostando da indescência!

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  7. Loretta, tia do autor, que nem sabe direito mexer em computador,atreve-se a fazê-lo para dizer que ADOROU!

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  8. Adorei! Mal acabei de ler, deu vontade de ler de novo! =)

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